sexta-feira, 7 de novembro de 2014

ALQUIMIA 
(Ferreira Filho)
Poeta é alquimista.
É aquele que transforma a matéria noutra matéria.
Matéria esculpida nas sensações,
Transformada em signos.
Poema é escultura de signos esculpidos sensualmente.
Poesia é coisa,
Mas uma coisa não como as outras coisas,
Embora as outras coisas sejam sua coisidade.
Poesia é feita de coisas que não conseguimos dizer
Porque o dizer é a morte da coisa.
Poesia é dia na noite.

Mas o dia tem muitos dias – como Gullar ensinou.
A noite tem muitas noites e à noite uma vida cheia de dias para rememorar.
Na pequena partícula do tempo o meu corpo feito poesia se desdobra na irrepetibilidade do instante.
A sobra, a dobra, a penumbra, a incompreensão de mim mesmo numa espécie de amostra.
O original? Que original?
Que origem?
Origem?
Quê?
Só resta resto e nisto ainda tudo!
Tudo o que me resta é meu corpo preso nessa braguilha entreaberta esperando a multiplicação.

Perdido meu futuro se desfaz na precoce ejaculação de palavras que se contradizem.
Corpo de palavras que querem fecundar quase a força (por isso se estuda retórica); inutilidade, precariedade de uma ponte que liga os humanos.
Ainda assim digo.
Digo e existo ou me condeno ao silêncio, à estupidez, à morte.

Seria melhor se pudesse cantar ou dançar o que tento dizer.

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